Bastante comum em meio a religiosidade Umbandista,
tratarmos apenas questões espirituais e litúrgicas, não voltando nossos olhares
a situações corriqueiras e que acabam acarretando situações degradantes e
desconfortáveis.
Quando lidamos com religião, ainda mais as voltadas
à espiritualidade, muito se torna instigante pelo fato do modo com que a
trabalhamos, nosso ritual e todo procedimento. Ao sentarmos para adquirirmos
aprendizados, muito esperamos apenas magias, métodos ritualísticos e questões
voltadas apenas a parte RITUALÍSTICA, mas ficamos estarrecidos quando o
Sacerdote aborda conceitos de comportamento e ética.
Pode parecer desnecessário, tendo em vista que, intrinsecamente, todos nós temos uma conduta que, se desvirtuada ou
contrariada, nós mesmos nos sentiremos mal, fugindo de nossa Ética e Moral.
Mas se bem observarmos, como encarnados e em busca
de evolução espiritual, estamos passíveis a erros e são com eles que
aprendemos. É claro que as vezes cometemos os mesmos erros várias vezes, mas
cabe a cada um de nós saber entender que compete privativamente a nós darmos um
basta, afinal, passa por situações desagradáveis várias vezes quem quer, pois a
solução para sair do enrosco, já encontrou.
Outros continuarão nos mesmos passos, podendo
perdurar por tempos ou anos, quiçá outras encarnações, pois tudo isso, inerente
a missão de cada um, é que vai trazendo a evolução que cada um de nós
precisamos.
Abordo isso, prima facie, pois falaremos sobre
questões comportamentais dos médiuns e auxiliares dentro do terreiro de
umbanda, declinando responsabilidades e obrigações.
Contudo, cumpre destacar que, antes de vestirmos o
branco e dirigirmos até os terreiros, existe procedimentos a serem realizados,
os quais denominamos de RITUAL INTERNO.
Quando falamos em ritual, imaginamos alguns
procedimentos que são diretrizes para realizar algo ou chegarmos em algum
objetivo. Voltado a religiosidade, ritual são todos os procedimentos que nos
levam a nos “conectar”, nos “ligar” ao sagrado, ao divino.
Assim, imaginemos que, durante a semana conturbada,
muito difícil seria nos conectar à espiritualidade quando nossos corações e
pensamentos estão desequilibrados ou energeticamente negativados. Sempre
precisamos intensificar nossas vibrações e nossas orações para que, aos poucos,
toda egrégora negativa formada seja dissipada e quebrada.
Seres humanos, passíveis a erros e sujeitos a
situações que nos testam, estamos sempre em uma inconstância. Dara nós que
nossas vidas fosse apenas uma linha retilínea sem qualquer embaraço. Verdadeira
utopia!
Pois bem!
Antes de chegarmos aos terreiros, realizamos nossos
ritual interno, onde intensificamos nossas vibrações, realizamos nossos banhos
de ervas, equilibramos nossos eledás (chacras), tudo para que, ao chegarmos no
terreiro, possamos nos doar e nos entregar nas vibrações da espiritualidade
superior.
Não basta vestirmos uma roupa branca e irmos aos
trabalhos com os corações e pensamentos totalmente impregnados com ódio, mágoa,
rancor. Devemos, seja umbandista ou não, realizarmos nossa reforma íntima,
abdicando de muitas situações, sentimentos que acarretam um mal estar físico,
psicológico e espiritual.
Se estamos buscando um aprendizado e sermos melhores
a cada dia, nossas atitudes devem ser revistas constantemente, pois só assim
alcançaremos e cumpriremos com um pouco de nossa missão.
Então, de forma sábia, já somos conscientes e
estamos cientes de que uma roupa branca ou uma incorporação não trará sua
purificação. Devemos, antes de qualquer ato, abdicar de algumas situações e nos
entregar de copo e alma para aquilo que nos propusemos a realizar.
Salienta-se que a espiritualidade, os guias e
mentores espirituais, por mais de alta envergadura de evolução espiritual que
estão, utilizam também de nossas energias para auxiliar aos necessitados. Não
basta incorporar. Tem que saber se entregar!
Um médium que, por situações “x” que lhe ocasionaram
uma certa irritação, jamais deve, naquele dia específico, trabalhar na gira de
caridade dando os passes. Por mais amparo que tenha, naquele dia não estava
psicologicamente preparado para trabalhar e sua energia carregada
negativamente, pode surtir efeitos no corpo espiritual do irmão necessitado.
Parece que basta apenas fechar nossos olhos e
incorporar, pois ali a entidade que estará realizando os trabalhos. Porém,
sabemos que não é bem assim!
Há uma reciprocidade entre o médium e o mentor
espiritual e ambos devem sempre estar em sintonia, nas mesmas vibrações, pois
mesmo incorporado, pode o médium sofrer uma queda e começar uma fase de
mistificação.
Salienta-se na máxima “Umbanda é coisa séria para
gente séria”.
Mostro, de início, a responsabilidade inerente a
cada um, principalmente àqueles que trabalham na linhagem de Umbanda ou
vertentes espíritas. Devemos sempre nos vigiar, pautar nossas vidas na retidão
de bons princípios e atos, pois contrariado, infringimos uma lei espiritual:
“Amai ao próximo como a ti mesmo”.
Devemos realizar reformas íntimas em nossos
corações, em nossos pensamentos. Devemos saber amar e sermos amados, devemos
respeitar, renegar determinadas situações, abdicar de sentimentos errados e
renová-los, saber perdoar e reconhecer nossos erros.
Muito apontamos nossos dedos para criticar, para
dizer que não gosta de “fulano ou beltrano”, mas jamais procuramos saber se
àquele irmão (ã) está com algum problema. É tão mais fácil criticar do que
estender a mão amiga.
Por isso devemos nos amar, pois quem tem o amor
própria não tem tempo para criticar seu semelhante, mas auxiliá-lo quando
necessário.
Ser médium é isso, pois inúmeras vezes seremos
chamados para ajudar àqueles que um dia nos fizeram mal, e por óbvio, não
poderemos renegar a isso.
Conseguem observar quantas coisas se escondem atrás
de um branco, colares e ritualísticas. De nada adianta realizarmos tudo isso,
quando na realidade nossa carne está voltada para outras situações ou
impregnadas de ódio e falta de amor.
Assim, ter em mente que, se desejamos realmente
ajudar e sermos ajudados, muitas coisas precisamos mudar e que sejam internas,
voltadas a cada um.
Assim, feito essa reflexão, vestimos o branco para
ir ao encontro de nossa religiosidade e dispostos a ajudar àqueles que nos
pedem socorro, sejam situações cármicas ou espirituais.
Chegamos ao terreiro, realizamos todos os
procedimentos necessários e aguardamos o início de nossos trabalhos.
Por óbvio, tudo deve ter uma hierarquia, a qual
devemos observância e obediência. Respeito as regras espirituais e as impostas
pelo líder religioso. Se há uma hierarquia, há também cargos e funções, as
quais são dotadas de responsabilidades e missões que devem ser cumpridas.
Iniciamos com o sacerdote de umbanda (pai de santo),
àquele médium que, por longos e derradeiros anos, foi preparado fisicamente e
espiritualmente pela espiritualidade para que conduzisse e cuidasse de outras
pessoas.
Ser Sacerdote não é algo fácil ou prazeroso, mas
exige uma responsabilidade consigo e para com os outros, tendo em vista que os
cuidados dos demais médiuns depende exclusivamente daquele sacerdote.
Exige abdicação de sentimentos, pois este será o
mais procurado para socorro e não deverá declinar de ajudar o solicitante. Faz
parte de sua missão!
Logo no início disse que devemos realizar uma
reforma íntima, saber perdoar e amar. Assim, imaginemos a hipótese de um
sacerdote, cujo o qual é espelho e diretriz aos seus filhos espirituais, renega
em ajudar e auxiliar seu inimigo, mesmo que de longas datas.
Seria contraditório dizer algo e praticar o inverso
ao ensinado. E claro que isso não só compete ao sacerdócio, mas a todos nós,
desde ateus a religiosos.
Cumpre ao sacerdote ter o zelo e a responsabilidade
com suas condutas, seja dentro ou fora do terreiro, pois ele é o espelho dos
demais irmãos. Além dos conhecimentos práticos, magísticos e litúrgicos, deve conhecer
a si e aos seus filhos, sabendo orientar, ensinar e corrigir como se ali
estivesse a figura de um pai com laços sanguíneos.
Sacerdote deve respeito e merece respeito, pois ele
é a autoridade máxima dentro do terreiro, mas também passível a erros e
correções quando necessária. Lembre-se: somos de carne e osso!
Em questões de hierarquia carnal temos de início os
Pais e Mães, mas tudo tem sua base e logo encontramos como alicerces os
médiuns, seja eles novatos ou àqueles que, através do dom mediúnico, ajudam o
próximo.
Ser médium também é responsabilidade, mas também
gratificação, pois esse dom lhe foi dado para auxilio e ajuda ao seu próximo.
Assim como um objeto de porcelana que se não cuidado pode quebrar, a
mediunidade também. Se mal utilizada, assim como lhe foi concedido para cumprir
uma missão e resgate, ela pode ser retirada.
Médium de Umbanda deve sempre, antes de mais nada,
saber suas limitações. Praticar desde o início sua reforma pessoal, crescer e
mudar a cada dia, pois é isso que necessitamos, MUDANÇA!
Reconhecer seus erros, reconhecer quando está
cometendo algo errado e corrigir sem medo de represálias, pois aí estará a
simplicidade e humildade do médium de aprender com seus erros. Não basta apenas
ter 30 anos de umbanda, quando em suma realidade internamente não absorveu ou
abdicou de coisas que faz com que o nosso perispirito entre em um verdadeiro estado
de putrefação.
Deve sempre seguir nas leis divinas, respeitar as
orientações espirituais, reconhecer seus erros e saber o momento de agir. Se
reconstruir a cada dia e entrar em paz consigo mesmo, renovando suas energias e
sua fé.
Médium que se doa pela espiritualidade para ajudar,
deve ter em mente que, naquele ato divino, deve esquecer a sacola dos problemas
e se abrir de coração, possibilitando a aproximação dos espíritos falangeiros
de luz e permitindo que façam um acoplamento de energias nossas e as que
irradiam, tudo como forma de ajudar àqueles que chegam até nós.
Desta forma, um médium que passa um dia conturbado,
com irritações, certamente não terá uma incorporação por completo e se abusar,
transmitirá ao consulente energias não muito firmes, podendo ali gerar graves
problemas espirituais.
Saber reconhecer sua inaptidão para trabalho em dias
ruins, é ter a ciência que somos seres limitados e ainda ter a humildade de assim
saber. É ter, antes de mais nada, amor ao seu semelhante, pois não transmitirá
vibrações maléficas e dará ao consulente a oportunidade que seja ajudado de
outras formas, com outros guias.
É não ser egocêntrico e o centro das atenções, afinal
Umbanda não é espetáculo, mas religião. Médium nenhum pode se achar “o melhor”,
pois em sede de espiritualidade todos somos leigos. Temos ciência do básico,
mas do máximo, um eterno dilema.
Assim, cabe o médium vigiar seus sentimentos,
respeitar seu irmão e amá-lo. Quem ama jamais terá a preocupação de entrar em
questões que desagradam ou atém mesmo que te coloquem a beira de um abismo.
Deve sempre estudar, questionar seu dirigente,
manter zelo na incorporação, manter sigilo do que é confiado. É claro que o que
é confiado é para o guia, mas quando tratamos de mediunidades conscientes, o
médium lembrará de tudo. Seria muito ruim e antiético revelar algo que não lhe
compete a terceiros.
Consulta-se os guias e jamais o médium.
Lembre-se sempre que somos apenas veículos para que
irmãos de luzes se comuniquem e pratiquem a caridade. Não somos mais nada que
isso!
Como canais, devemos ter ética e postura durante a
gira e até depois dela. Canal que esteja danificado ou poluído, será difícil
uma passagem de elementos essenciais a nossa jornada e vida.
E da mesma forma deve se portar àqueles médiuns que,
embora não incorporem, auxiliam dentro do ritual. Chamamos de Cambonos
(cambones), os quais são de extrema importância, pois auxiliam as entidades
incorporadas e ficam atentos quando algo de errado está acontecendo durante a
gira.
São eles que prestam auxilio e muitas vezes têm
ciência do que se passa com determinado consulente. Ser cambono é
RESPONSABILIDADE, assim como todos os demais cargos exigem, e um manto de
SEGREDO.
Quando um consulente chega defronte a entidade
espiritual, ali expões segredos dos mais diversos tipos que, se necessário,
deverá ter uma atuação imediata do guia espiritual. Se solicitado o auxílio do
cambono, este deve se doar e ajudar, mas jamais ao término, expor o que estava
se passando na vida daquela pessoa.
Olha que situação desconfortável que não geraria.
Não devemos, de forma alguma, espalhar aos quatros
cantos do mundo o que se passa dentro de uma gira de umbanda. Assim como
devemos mantar nossa “sacola de problemas” em casa para irmos a gira, quando
saímos do trabalho umbandista devemos esquecer nossa “sacola religiosa” lá
dentro.
Pensa você se um padre ou pastor revelasse todos os
segredos que forem lhes confiados no ato da confissão. Certamente geraria um
caos. Por qual motivo então na umbanda tem que ser diferente?
Tudo que se passa deve se manter em segredo e
esquecido quando não estar mais no terreiro. Somos regidos por uma lei
espiritual e uma lei carnal, sendo que podemos sofrer punições quando
acometidos em erro.
Nossos comportamentos e atitudes devem ser
condizentes com que pregamos. Devemos saber nossa posição e respeitar as hierarquias,
regras e até mesmo regras que não foram impostas pelo guia ou pai de santo, mas
que a nossa consciência diz.
Se contrariarmos ela, com certeza não deitaremos com
a mesma paz anterior que antes. Aliás, já não deitamos confortavelmente, pois
somos pecadores. Não sabemos perdoar, não sabemos amar, mas pior seria se
fizéssemos algo que prejudica muito mais a terceiro.
Então, os comportamentos e atos dentro da umbanda
devem ser seguidos a risca. Em caso de falhas, perdoados seremos, mas
consequentemente sofreremos uma reprimenda por termos sidos negligentes,
antiéticos e desrespeitosos com a casa em que trabalhamos, com seu dirigente e
o pior, com o próprio plano espiritual.
Saiba, amados irmãos, que papel não faz ninguém
melhor que o outro, mas são nossos atos que nos tornam diferente de muitos. Por
isso, ame, para de criticar, saiba ouvir e olhe para seu próximo como irmão e
seu semelhante. Você não é melhor, mas alguém em evolução como todos os demais
mortais dessa terra.
Suplico a Olorum que, ao lerem, possam refletir da
mensagem que propus trazer aos senhores. Que no novo amanhã, vocês abdiquem de
sentimentos e passem a reformular a vida e chegar em um novo fim!
“Amar e ser amado, pois é dando que se recebe.
É perdoando que se é perdoado.
E é morrendo que se vive,
Para vida eterna”.
É perdoando que se é perdoado.
E é morrendo que se vive,
Para vida eterna”.
Oxalá vos abençoe!
Pai Igor Luís de Camargo
Sacerdote de Umbanda e Coordenador Regional do
Superior Órgão Internacional de Umbanda e dos Cultos Afro.
Sacerdote de Umbanda e Coordenador Regional do
Superior Órgão Internacional de Umbanda e dos Cultos Afro.